No meio por onde navegam os praticantes do aprendizado social/informal e interessados em curadoria de conhecimento, do qual participo ativamente, fala-se muito sobre a idéia de narrar nosso trabalho. Isso se tornou decididamente mais fácil de fazer na última década, devido às muitas novas ferramentas que surgiram para facilitar esta prática.
Ao compartilhar o que estamos fazendo e como estamos aprendendo, estamos compartilhando conhecimento tácito (informal), que é normalmente coisa muito difícil de capturar; estamos convidando outras pessoas a dar-nos feedback e motivar-nos em nosso empreendimento; estamos convidando outros para aprender conosco; estamos documentando nosso trabalho e aprendizado para uso futuro; e estamos vinculando nosso aprendizado aos esforços de outros. Aqui apresento uma história verídica de como um reabilitação física se transformou em aprendizado que se tornou um hobby que se tornou uma comunidade de prática e resultou em dois negócios de sucesso, tudo isso usando métodos de aprendizagem informal autodirigida e tecnologia sociai. E tudo em seis meses.
Aprendizagem informal autodirigida e aprendizagem social
Tenho uma conhecida da minha cidade natal, Gloria Melton Mercer, que se tornou minha amiga do Facebook há algum tempo atrás. Gloria, uma professora de arte aposentada do ensino fundamental, precisou de uma cirurgia em sua mão em outubro de 2011 e foi informada que, para ajudar em sua reabilitação, precisaria encontrar uma maneira de reconstruir sua força e destreza. Pensando em como, “Você deve misturar algo divertido com algo que você precisa fazer, certo?” ela decidiu aprender sozinha a criar biscoitos de padaria elaboradamente decorados (o aluno identificando as próprias necessidades; assumindo a responsabilidade pela aprendizagem; escolhendo as próprias soluções).
Gloria começou assistindo vídeos no YouTube, muitos criados por blogueiros cujo trabalho ela passou a seguir (aprendizagem autodirigida). Muito de seu aprendizado foi através da prática de tentativa e erro (aprendizado experiencial). E ao longo do caminho, ela decidiu compartilhar seu projeto com seus amigos do Facebook (porque aquela câmera no celular é realmente fácil de usar; o Facebook torna as coisas tão fáceis de postar; ela queria pedir feedback; ela achou que seria divertido compartilhar seu trabalho; ela havia aprendido com outros que compartilharam o trabalho deles). Muitas fotos incluíam comentários sobre o que ela estava aprendendo e como (narrando seu trabalho e aprendendo em voz alta).
Uma comunidade de prática (CoP)
Então: a medida que Glória explorava vídeos e blogs, ela tomou consciência da existência de uma comunidade bem ativa de pessoas que compartilhavam interesses semelhantes aos dela. Ela começou a interagir com blogueiros, fazendo perguntas e compartilhando o que ela mesma ia aprendendo. Inpiradas com as criações que Glória compartilhava no Facebook, a sua filha, Marlo, e sua amiga, Whitney, decidiram que também queriam aprender a fazer biscoitos decorados. Logo, elas começaram a compartilhar o que estavam aprendendo; todos participavam explicitamente tendo a intenção mútua de aperfeiçoar essa sua nova habilidade (de acordo com Etienne Wagner, essa é exatamente a definição de uma comunidade de prática).
Conforme iam praticando, elas se tornaram membros muito ativos de uma verdadeira comunidade de prática, produzindo artefatos (receitas, biscoitos e fotos de suas criações), um repertório (uma biblioteca de formas de biscoito e técnicas que iam dominando com o tempo, como por exemplo “air-brushing” e personagens de desenho animado; e um vocabulário específico para a comunidade de decoradores de biscoitos/confeiteiros). O repertório também incluía uma outra prática típica de comunidades, onde os membros desenvolvem linguagem, referências e humor próprios. A medida que elas seguiam praticando, o restante de nós observávamos, motivando-as, sugerindo ideias para biscoitos e comentando e dando feedback sobre suas criações. Eventualmente Glória aumentou sua participação na CoP, quando começou a ensinar.
Transferindo a experiência para aplicação real no mundo do trabalho
Agora? Glória segue aperfeiçoando sua técnica, mas biscoitos continuam a ser um hobby para ela. Marlo abriu e opera a empresa Coastline Cookies
(biscoitos da orla) em Midlothian, VA, U.S.A. Whitney abriu e opera a empresa Beach House Cookies (biscoitos da casa de praia) in Virginia Beach, VA, U.S.A. E qual é o retorno de investimento “ROI’ desta experiência social e informal de aprendizagem? Acho que vocês devem solicitar a Marlo e Whitney seus relatório de ganhos anuais. O que sei é que agora ambas possuem empresas bem sucedidas, gerando lucros já depois de alguns meses, enquanto antes não tinham nada.
E foi assim que tudo aconteceu
Foi assim que a prática e a comunidade cresceram.
De Outubro de 2011 a Janeiro de 2012
Glória aprende o básico de decoração de biscoitos através de vídeos do YouTube, e descobre que muitas das pessoas postando vídeos tem páginas de blog e Facebook. “Encontrei uma empresa chamada Karen’s cookies, que mostrava como fazer biscoitos e decorá-los. Achei que está empresa estava dando informações corretas pois queriam que as pessoas comprassem seus suprimentos (avaliando a credibilidade das informações). O site da Karen’s Cookies comparte também alguns de seus blogs favoritos. Muitos dos blogueiros também têm páginas no Facebook. Compilei uma lista especial no Facebook, que eu possa assistir todos os dias para ver as criações de cookies mais recentes. ”
Em janeiro, Gloria começa a postar fotos de seus primeiros esforços, que ela chama de "lixo", mas relata que, quando tem comida na parada, até maridos famintos gostam de "lixo". (Figura 1)
Figura 1: 3 de janeiro de 2012 – criando “lixo”
Tudo progride muito rapidamente (Figura 2)
Figura 2: 10 de janeiro de 2012 – biscoitos não são mais “lixo”; Glória comenta sobre seu aprendizado
Figura
3: 13 de janeiro de 2012 – Gloria sente confiança suficiente para oferecer seus
biscoitos como presentes para a família
Em família, o aprendizado torna-se uma experiência compartilhada, e o grupo aumenta (Figura 4). A filha de Glória, Marlo, que vive a 200km de distância, assim como sua amiga Whitney se junta ao grupo. Glória descreve a necessidade de “parar e refletir” quando está se aprendendo a decorar biscoitos.
Figura
4: 18 de janeiro de 2012 - Gloria diz
que ainda não consegue fazer sua mão e o glacê "fazerem o que ela quer"
Fevereiro de 2012 a abril de 2012
Uma empresa nasce em fevereiro de 2012. (Figura 5) Marlo obtém uma licença comercial e funda a Coastline Cookies. Marlo diz: “Depois da experiência com os biscoitos do Dia dos Namorados, mamãe e eu ficamos muito empolgadas. Passávamos horas do dia assistindo a vídeos, lendo blogs e ligando uma para a outra para compartilhar o que havíamos aprendido. Nós continuamos fazendo isso!"
Figura
5: fevereiro de 2012 – Marlo e seu marido Mike começam a receber pedidos de
biscoitos
E a habilidade vai aumentando. (Figura 6)
Figura 6: primeira vez de Glória aplicando a técnica de airbrush
Em Abril, as encomendas estão a caminho... (Figura 7)
Figura 7: Abril de 2012 – Glória está produzindo dúzias de biscoitos lindos
Uma atividade chave na construção de uma comunidade de prática é o aprendizado mútuo entre os membros (Figura 8)
Figura 8: Glória começa a ensinar
Maio de 2012 a julho de 2012
Em maio de 2012, Marlo aprendeu Web design para poder lançar e gerenciar o site da Coastline Cookies http://www.coastlinecookies.com/. (Figura 9)
Figura 9: Julho de 2012 - A empresa ‘Coastline Cookies’ de Marlo já é um grande sucesso
A empresa de Whitney também está prosperando. (Figura 10) https://www.beachhousecookies.com/index.html
Figura 10: Julho de 2012 - a ‘Beachhouse Cookies’ de Whitney também está indo bem
Glória continua a aprender novas técnicas e a compartilhar seu aprendizado conforme ela avança, enquanto os amigos continuam à procura de novos e interessantes cortadores de biscoitos. Agora Glória passou a ter interesse especial em aprender como fotografar seu produto final. (Figura 11)
O que isso tem a ver com
aprendizado organizacional?
Há tantas lições a serem aprendidas com este
caso. Eles incluem: o aspecto social de publicar seu aprendizado, obter
feedback e motivação de amigos e ajudar outros amigos enquanto eles aprendem; o
fato de que o entusiasmo pode ser contagioso; a vontade de compartilhar e não
guardar tudo para si; a forma real como o conhecimento é compartilhado; a forma
orgânica de crescimento de redes/comunidades..
E ainda aprendemos mais: que o aprendizado muitas vezes gera o desejo de mais aprendizado (como Web design e fotografia); que é futilidade acreditar que podemos “capturar” conhecimento como um conjunto de dados em uma planilha; que “gerações” não tem influência no aprendizado; a forma pela qual a tecnologia social pode acelerar o aprendizado e dar-lhe alcance geográfico; e o valor de uma comunidade verdadeiramente comprometida com a melhoria de sua prática.
Isso é aprendizado social. Isso é aprendizado informal. Isso é narrar nosso trabalho.
Para concluirmos, fica a pergunta: Para Glória, isso era um hobby, mas para Marlo e Whitney tornou-se um emprego de tempo integral. Como podemos encorajar outras pessoas a narrar seu trabalho? Que suporte ou ferramentas poderiam encorajar esta prática? No que isto poderia ajudar o técnico de manutenção a criar uma maneira mais rápida de resolver seu problema? Ou o chef de cozinha que está desenvolvendo uma nova técnica culinária? Ou o engenheiro de software que ...? Ou o técnico judiciário que ...? Que oportunidades estamos perdendo?
Texto original em inglês por Jane Bozarth em 07/08/2012: https://learningsolutionsmag.com/articles/984/nuts-and-bolts-narrating-our-work
Texto traduzido e adaptado ao Português por Daniella Cunha Teichert para a Comunidade Working Out Loud Brasil / WOLonlineBR
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